02/08/2025

Um farol que sinaliza o abandono


 Um magnífico passeio de barco a partir de Oeiras, organizado pela empenhada associação cultural Espaço e Memória [ver aqui]  permitiu ir ao encontro do Farol do Bugio, em rigor ao Forte de São Lourenço, em cuja circular se encontra a encimar uma torre. 

Hoje não se exige a presença de faroleiro, sendo gerido remotamente. 

Houve tempos em que teve vasta guarnição militar e serviu como prisão, tal como o sinistro forte de São Julião da Barra, de triste lembrança.

A visita foi, pois, ao forte que se encontra num lamentável estado de degradação.  

Mas a própria torre do farol está a desmoronar. Ampliada a fotografia, notam-se as pedras partidas e em risco de cair.


As pedras da amurada começam a não estar em melhor estado.

Entrando nas instalações do forte, é a total desolação. Neste quarto que foi do faroleiro, o reboco caiu, o madeirame apodreceu.





A capela, cujos azulejos são tidos como referência, está assim.


Haverá seguramente, entre as entidades civis e as militares o que se denominam as autoridades responsáveis, as que, comumente não assumem a responsabilidade do que seja. E é este um de tantos exemplos da entrega à morte do que é vida da nossa História.

01/03/2015

O corpo e alma


É, na sua formulação literária, a melhor expressão da dualidade corpo/alma, a precariedade daquele. Leio-a no comovido texto de Álvaro Ribeiro sobre a morte de "José Régio", escrito a 14 de Maio de 1970: «Exactamente porque o seu corpo já era velho, débil e frágil, estava em perigo de ser separado da sua alma, forte, nobre e superior».
Só os que confundem alma e espírito não alcançam a dimensão do que a frase contém, a sua avassaladora pujança, a superior dignidade que a anima.

15/11/2014

O tempo por haver


Li, a caligrafia incerta, num apontamento de um caderno de notas que será um livro, agora em esboço ainda de preparação para ser editado. Imagino que quem escreveu tivesse chegado àquele momento da vida anterior ao que me encontro hoje. E digo imagino porque suponho que a brisa de angústia que perpassa por quem, como eu, chegou aos 65 anos tem de ser mais violenta do que a que fica na frase que recolhi na memória; ao mesmo tempo tudo farei para que seja mais mobilizadora, me restitua ânimo e faça descobrir modo para a viagem que resta: «chega-se a uma idade em que cada dia a mais é um dia a menos», eis a frase.
Há um tempo em que, eu sei, dos ponteiros do relógio já só restam os segundos, em que tudo é mais rápido, incluindo a vontade de viver, o martelar cardíaco do tempo por haver.

15/03/2014

A fragilidade da distância


Num comovido texto que leio este Sábado enfim de Sol no suplemento cultural Babelia do jornal espanhol El Pais, Antonio Muñoz Molina a propósito da lápide funerária de Hannah Arend (Blucher), que há anos encontrou num pequeno cemitério a duas horas de comboio de Nova York, pertencente ao Bard College, escreve um texto magnífico, que é, no aparente imediato, sobre as oficiais trasladações dos despojos daqueles que a morte veio a ilustrar, a conveniente reparação da injustiça histórica, mas é, na sua essência sentimental - e quem o escreve confessa-se sob a «fragilidade sentimental do que viaja sozinho - um poema sobre quanto o longe morrer do local onde se nasceu é «um monumento mais expressivo do que qualquer inscrição».

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Fonte da imagem: aqui

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Sobre Antonio Muñoz Molina veja-se a sua página, aqui.

19/08/2013

Forcadas

Necrópole em Forcadas. Datam do medievo. O povo julga-as muçulmanas. O não estarem todas orientadas a Nascente inculca origem não cristã. São de pequena dimensão. Para corpos pequenos. Em pedra. Para a eternidade.

15/08/2011

A Assunção de Maria e a indignação de Deus

Creio que do ponto de vista teológico a ideia da morte de Maria, mãe de Jesus, não encontra obstáculo. Há a ausência do facto histórico da sua morte, ou a inexistência de evidência que a comprove. Daí que a Igreja Católica festeje a Assunção de Nossa Senhora aos Céus, em corpo e alma, mas trasmute a sua morte numa dormência, deixando em aberto o saber se a sua subida aos Céus se deu ainda em vida ou depois disso. 
De entre os dogmas inerentes ao culto mariano - a Perpétua Virgindade, a sua Imaculada Conceição, o ser Mãe de Deus - a Assunção de Maria foi entronizado em 1950 pelo Papa Pio XII, por decreto, o mesmo da Infalibilidade Papal. Segundo o seu texto: 

« (...) declaramos e definimos ser dogma divinamente revelado que: a imaculada Mãe de Deus, a sempre virgem Maria, terminado o curso da vida terrestre, foi assunta em corpo e alma à glória celestial (...) pelo que, se alguém, o que Deus não permita, ousar, voluntariamente, negar ou pôr em dúvida esta nossa definição, saiba que naufraga na fé divina e católica.

Princípio autoritário foi imposto sub poena: «a ninguém, pois, seja lícito infringir esta nossa declaração, proclamação e definição, ou temerariamente opor-se-lhe e contrariá-la. Se alguém presumir intentá-lo, saiba que incorre na indignação de Deus onipotente e dos bem-aventurados apóstolos Pedro e Paulo».

14/12/2010

O florir da vida


Surgido como se de um pesadelo, não é a ideia do fim mas do findar-se, o degradante exercício de como encontrar dignidade da indignificação que nos persegue, vindas das catacumbas das ruas, pelos jardins, nos confins dos nossos lares, no mais fundo dos nossos remorsos. Só o amor nascido nas cavernas do horror consegue dar ânimo e força para que não os rejeitemos, rejeitando-nos, enforcando-nos pela cobardia de desejarmos a beleza eterna, mesmo patética. A haver decência acabava tudo antes, no tempo em que a vida nos floria.